zoom

Com fantasia e romance, dramas coreanos conquistam fãs no Brasil


Responsáveis por páginas e portais que divulgam a dramaturgia coreana no Brasil apontam características e diferenciais que tornam as produções da Coreia do Sul cada vez mais populares

Se você acompanha o mundo da música, dificilmente nunca ouviu falar de k-pop, o estilo musical que tem colocado a Coreia do Sul como um dos expoentes da música pop no mundo. Desde o início dos anos 1990, o país asiático tem investido em uma indústria para formação de boybands e girlbands, com videoclipes super produzidos e músicas que navegam entre diferentes estilos de música, e o resultado tem sido uma popularidade que coloca os fã-clubes de ídolos de k-pop em pé de igualdade com grandes nomes da música pop americana. O que você talvez ainda não conheça é outra vertente do entretenimento sul-coreano, com potencial de popularidade similar ao do k-pop. As séries televisivas da Coreia do Sul (conhecidas como “doramas” ou “k-dramas”, do inglês “Korean Dramas”), junto do k-pop, fazem parte da Hallyu, sigla que define a “Onda Coreana”, ou seja, a popularidade da produção cultural e da tecnologia do país pelo mundo.

Com média de 20 episódios de 50 minutos cada, as produções televisivas da Coreia começaram a ganhar popularidade fora das fronteiras do país no início dos anos 2000, quando foram exportadas para a China e depois para outros países asiáticos, Europa e América Latina. Mas foi pela internet que as histórias produzidas na Coreia chegaram ao Brasil e conquistaram seguidores fiéis. “A chegada de sites de streaming como Viki, DramaFever, Netflix e Crunchyroll e a onda Hallyu foram essenciais para o aumento da popularidade dos dramas no Brasil. Se antes um grupo (no Facebook) de doramas tinha dez mil membros, hoje tem quarenta mil. O aumento de curtidas da nossa página também tem demonstrado isso”, conta Ana Tércia, administradora da página Frases de Dramas e Filmes Asiáticos. “Sempre gostei muito de séries, quando conheci os dramas estava passando por uma ‘ressaca’ das séries norte-americanas que acompanhava. Desde o primeiro vídeo que assisti, me interessei pelos dramas, algo me cativou. Depois surgiu a curiosidade por conhecer culturas tão diferentes da nossa”, conta Carolina, tradutora no fórum FightingFansub.

A facilidade com que esse tipo de produção pode ser assistida em português se deve grande parte a páginas e portais dedicados a tradução dessas produções para o português, como o Viki. A página criada em Cingapura distribui dramas coreanos online e conta com equipes que trabalham de forma colaborativa para a produção de legendas em mais de 160 idiomas. Em média, cada drama exibe dois episódios por semana e as produções distribuídas para o Viki chegam ao portal quase que simultaneamente à transmissão nas emissoras da Coreia. “As produtoras coreanas têm buscado um conteúdo que agrade a um público mais ‘universal’, mantendo a sua linguagem, pensando não somente no público brasileiro. Também vejo que as plataformas de streaming, principalmente a Netflix, tem ajudado a familiarizar o público com os doramas coreanos. Sempre que abro a lista de novidades da Netflix tem algo da Coreia”, explica Renata Evelyn, uma das colaboradoras da equipe VikiPT, que legenda os dramas coreanos no Viki para os brasileiros, e que também mantêm o blog Dramaholics, em que escreve sobre as produções coreanas.

Os primeiros dramas coreanos que conquistaram a popularidade do público se baseavam em histórias com uma mesma fórmula, que envolvia um protagonista rico e arrogante que se apaixona por uma mocinha pobre e sofrida, como “Boys Over Flowers”, de 2009, e “Secret Garden”, de 2010. Renata Evelyn acredita que um dos fatores que tornaram esses dramas atraentes ao público é a mistura entre realidade e fantasia, com tramas focadas em personagens cativantes. “Eles contavam histórias criveis, mas não eram tão realistas, ou naturalistas, quanto às produções brasileiras. Hoje eu sei que isso é a linguagem que eles adotam. As produções focam em fantasias e principalmente nos sentimentos das personagens, quase como uma leitura do que se passa na mente deles. Por isso temos esses planos longos dos rostos dos atores”.

"Secret Garden", de 2010, apostava em fórmula clichê de dramas da época
“Secret Garden”, de 2010, apostava em fórmula clichê de dramas da época

“A forma como eles tratam o relacionamento sem apelar para o lado vulgar como muitas novelas brasileiras e americanas é o ponto principal para muitos dos fãs. E os clichês que nunca perdem o encanto, não importa quantas vezes ele seja repetido drama pós drama. O povo ama e eu também. E aquele maravilhoso secundário/anti-herói espinhoso por fora, mas com um coração derretido por dentro, mas que nunca fica com a mocinha, então esperamos que fique com a gente”, conta Sarah Simeya, administradora do Bestkdramas. “E também o fato da cultura deles ser bastante diferente como, por exemplo, pelo uso de honoríficos. A nossa é extremamente influenciada pela cultura americana, então o que vemos nas séries de lá não difere muito da nossa realidade”, acredita Ana Paula, tradutora no FightingFansub.

Para Adriana Anacles, editora do DoramaEver, o principal diferencial entre os dramas coreanos e as séries televisivas americanas e as novelas no Brasil é a quantidade de episódios. “A trama acaba se desenvolvendo mais rápido, o núcleo de personagens é menor, o jeito de gravar é diferente sempre dando ênfase nos personagens principais devido ao fato de não ter vários núcleos”. Já Rayanne Soares, administradora do Dorama Lovers, aponta uma questão cultural. “Os coreanos são mais reservados, então a maioria dos doramas tendem a ser mais delicados e ‘fofos’ comparados às séries americanas e novelas brasileiras. Nós ficamos naquela expectativa do que irá acontecer a cada episódio”. “A atuação também é bem diferente. Os asiáticos têm uma expressividade única, que em um episódio conseguem te fazer ir do riso às lágrimas e voltar ao riso de uma maneira que você não sente que eles estão atuando. De fato incorporam o personagem”, aponta Natache Lyszy, responsável pela revisão de traduções no Fighting Fansub.

Com o tempo, as histórias abordadas nos dramas se tornaram mais complexas e as temáticas se tornaram mais diversas. Dramas que remontam a monarquia coreana ou policiais ganharam destaque, ainda que a história de romance entre os protagonistas ainda seja a abordagem favorita dos diretores coreanos. “Primeiramente foi o tipo dos enredos, fugia totalmente do clichê americano de filmes e séries, a forma como eles abordam variados assuntos sem banalizar. Suicídio, bullying e tantos outros assuntos que viraram tema das séries americanas esse ano, já eram muito abordados nos doramas. Eu sentia, e ainda sinto, muita emoção ao assistir”, aponta Arieta Valherri administradora geral do Dicas Doramas.

Com a popularização das produções pelo mundo, alguns clichês também foram deixados de lado, acredita Sarah. “Tenho notado a mudança da visão dos escritores e diretores. Antigamente era muito comum em um drama o mocinho salvar a mocinha, ou a maltratar e depois se apaixonar por ela, ou a famosa síndrome da Cinderela. Cenas de abuso de poder, de força, beijos forçados, machismo, submissão, vinganças sem sentido, e etc. Agora vemos a nova fase, em que as mocinhas são o centro do drama, sem necessariamente precisarem de alguém pra salvá-las. Vemos que não tem mais aquela coisa de puxar pelo pulso despreocupadamente como se isso fosse normal, por que até os telespectadores em seguida enviam reclamações para as emissoras de TV. Os casais estão cada vez mais reais, com relacionamentos começando de forma natural, com brigas naturais, e enfrentando situações do dia-a-dia de forma realística. E às vezes não basta encontrar apenas fantasia, mas um pouco de realismo também caí bem”.

Ana Tércia acredita que hoje os dramas coreanos estejam mais semelhantes às séries americanas e europeias. “A única grande diferença entre eles é que os doramas costumam ter apenas uma temporada e as séries tem como objetivo durar por muitos anos. Novelas latino-americanas são enormes (variam entre 100 e 300 capítulos), possuem várias tramas que muitas vezes não tem relação nenhuma com a história principal, creio eu que isso acontece por possuir vários escritores colaboradores, e tem perdido muita audiência nos últimos anos por possuir temas que agradam sempre o mesmo público (críticos falam que novelas fazem as mesmas histórias desde os anos 80). Acredito que os doramas assemelham-se mais as minisséries brasileiras do que as novelas”.

Para tornar suas produções televisivas ainda mais atraentes, a Coreia busca inserir ídolos do k-pop em suas séries, e muitos deles acabam conquistando destaque e priorizando a atuação em dramas a carreira musical. A série coreana de produção original Netflix “One More Time”, de 2016, é protagonizada por L, integrante da boyband Infinite, um dos expoentes do gênero, e mistura a fantasia típica dos k-dramas com planos e sequências típicos do serviço de streaming. “A indústria do entretenimento é bem simbiótica: o aumento do público do k-pop no Brasil leva ao aumenta o público dos k-dramas e vice-e-versa”, explica Renata Evelyn. Os k-dramas começaram a atrair a atenção de fãs de animação japonesa e da música, mas seu público se tornou mais amplo com a recente inclusão de diversas produções da Coreia do Sul no catálogo da Netflix. Na TV brasileira, os dramas coreanos chegaram até a canais pagos, como com a transmissão da série “Iris”, no +Globosat, em 2015.

"One More Time", tem oito episódios e é uma produção original Netflix
“One More Time”, tem oito episódios e é uma produção original Netflix

“Na internet vejo cada vez mais pessoas falando sobre os dramas: fanpages, grupos de doramas no Facebook e Whatsapp e o fato do Netflix disponibilizar esse tipo de conteúdo acaba alcançando pessoas que talvez o DramaFever e o Viki não ‘alcançariam’ por serem canais mais voltados para os fãs de dramas asiáticos”, acredita Adriana. “Pinocchio”, “Healer”, “Descendentes of the Sun”, “Goblin” e “Moon Lovers: Scarlet Heart Ryeo” são algumas das recentes produções de maior sucesso dessa nova fase do mundo dos k-dramas. “Eu sou professora de inglês, e em cada turma que tenho tem pelo menos uma pessoa que curte k-dramas e k-pop. E o mais legal é que percebo que não fica preso a uma idade ou gênero, por exemplo, conheço uma família onde o pai, a mãe e o filho assistem k-dramas”, conta Renata, de 28 anos, que também é colaboradora do VikiPT. “Espero que o interesse continue aumentando exponencialmente. Precisamos sair desse ciclo de consumir somente o que é produzido no ocidente”, conclui Renata Evelyn.

Por ShaKin’ Pop


Deixe seu comentário


Envie sua matéria


Anexar imagem de destaque