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Quando a música pop se encontra com as causas sociais


Quando a música pop se encontra com causas sociais, uma colaboração muito positiva surge daí, trazendo mensagens importantes que precisam ser difundidas

No último sábado, 6, Beyoncé lançou de surpresa uma música nova, “Formation”, cuja letra é um hino de valorização da cultura e da identidade dos negros, assim como o clipe, que traz várias referências à luta contra o racismo e pede o fim da violência policial contra a população negra. A canção foi apresentada no show do intervalo do Super Bowl no dia seguinte, numa performance que homenageou Michael Jackson, o Partido dos Panteras Negras e um negro morto por um policial branco.

É um capítulo interessante na carreira de Queen Bey, uma vez que muitos a acusavam de pouco participar de movimentos políticos, apesar de ter feito do feminismo a sua bandeira há mais de dois anos, quando lançou seu quinto álbum de estúdio, o qual levava seu nome e trazia canções sobre sexo, maternidade e empoderamento feminino.

E como esquecer sua icônica apresentação no VMA 2014, no qual Beyoncé ficou à frente de um telão que trazia “FEMINISTA” em letras maiúsculas? Antes disso, contudo, ela já cantava sobre empoderamento feminino nos seus tempos de Destiny’s Child (“Survivor” e “Independent Women”), mostrou quem manda no mundo (“Run The World”), participou de uma campanha para incentivar meninas a não terem medo de ser líderes e escreveu uma carta pedindo o fim da discriminação de gênero. Ou seja, o ativismo de Beyoncé esteve por aí, nós é que não prestamos tanta atenção.

Mas a cantora não é a primeira – e, com sorte, não será a última – a usar sua arte e sua voz a questões sérias. Conscientemente ou não, diversos artistas transmitem, através de seus trabalhos, uma mensagem muito maior do que eles mesmos, o que possibilita conversas importantes sobre temas que precisam ser discutidos para que possamos evoluir enquanto sociedade.

Embora alguns argumentem que a música pop é vazia de significado e feita apenas para vender – e esse argumento não é uma mentira completa -, também não se pode ignorar o desejo do artista em contribuir com causas que merecem atenção, afinal, eles possuem uma plataforma que muitos ativistas não possuem e é ótimo que a utilizem para fins positivos, tal qual Beyoncé fez no Super Bowl.

A seguir, veja algumas causas que os cantores pop apoiam:

Macklemore & Ryan Lewis:

Beyoncé não é a única ensaiando um retorno à música. O duo Macklemore & Ryan Lewis também vai voltar em 2016 e lançou, no final de janeiro, “White Privilege II”, uma música sobre o privilégio do rapper enquanto pessoa branca e sua responsabilidade social ao cantar um gênero musical criado por negros.

Com quase 9 minutos de duração, o single foi criticado por ativistas do movimento negro, que afirmam que o artista apenas “diz o que os negros vêm dizendo há tempos”, mas também foi elogiado por levar o racismo a uma audiência que ainda ignora o assunto: pessoas brancas. A canção tem a participação de Jamila Woods, que desafiou o público de Macklemore a pensar em ações para “criar um impacto de verdade na libertação negra.”

Essa não foi a primeira vez que a dupla usou sua arte na defesa de uma causa. Em 2013 eles lançaram “Same Love”, uma música de apoio aos direitos LGBT.

Lady Gaga:

A Mother Monster tem usado sua mega plataforma para defender duas causas recentemente: o fim do abuso sexual e o tratamento de doenças mentais.

No final do ano passado, Lady Gaga lançou “Till It Happens To You”, música que faz parte da trilha sonora de “The Hunting Ground”, um documentário sobre o estupro de mulheres dentro das universidades americanas e a falta de ação das instituições de ensino para punir os responsáveis por uma violência muito comum.

19% das estudantes do primeiro ano da faculdade foram vítimas ou sofreram tentativa de estupro, seja por força ou por estarem incapacitadas de consentirem por estarem embrigadas ou drogadas. A cantora também foi vítima de estupro na adolescência e tem falado abertamente sobre o tema. “Foi algo que mudou minha vida, mudou quem eu era completamente”.

Outra luta da artista é pelo fim do estigma sobre as doenças mentais. Ela possui depressão e ansiedade e quer incentivar, principalmente os jovens, a procurar ajuda. “É seu direito curar sua vida e sua perspectiva”, disse ela em um evento. Gaga também possui uma fundação para jovens LGBT e demonstra imenso apoio à essa comunidade.

Ellie Goulding:

Talvez você não saiba, mas no ano passado, Ellie Goulding chamou a atenção do Conselho de Hackney, em Londres, pela forma como estava tratando os moradores de rua da cidade. Foi dado aos policiais uma permissão para multar quem dormisse em espaços públicos.

Tweet: “Estou olhando para você, Conselho de Hackney. Como você pode fazer isso com pessoas em situação vulnerável, pessoas que mais precisam de você? Eu não consigo lidar com sua ignorância”.

Tweet: “Morar na rua não é uma opção de vida. É a última opção e cresceu 79% em Londres desde 2010. Isso porque as pessoas não se importam o suficiente”.

A cantora compartilhou em seguida uma petição pedindo o apoio das pessoas para que houvesse uma mudança na lei, o que acabou funcionando. Em 2014, Ellie também participou de um show para arrecadar fundos para uma organização que cuida de moradores de rua em Londres.

Usher:

Usher é outro artista preocupado com a violência policial contra a população negra. Seu mais recente clipe, “Chains”, é exatamente sobre o assunto. “A realidade é que a intolerância racial diminui as vidas de muitas pessoas no nosso país. Precisamos nos unir, enquanto nação, para resolver esses problemas, e essa é uma forma pela qual eu posso contribuir”, afirmou o artista ao lançar a música.

No vídeo, Usher foge da polícia e para numa igreja onde ocorre um velório, o qual descobre ser o seu. Negros segurando mensagens como “eu serei o próximo?” ajudam a dar o tom político da produção.

Miley Cyrus:

Em 2015, Miley Cyrus disse que é uma pessoa não-binária, não se identificando com os gênero masculino e feminino, afirmando que não se importaria se um futuro amor também não se identificasse da mesma maneira. “Eu sou igual. Eu sou a mesma. Não tem nada a ver com algumas partes de mim ou como eu me visto ou como pareço. É, literalmente, como eu me sinto”, contou ela à revista TIME. “As pessoas tentam fazer com que todo mundo seja algo. Você pode ser o que quiser”.

De lá para cá, a voz de “Wrecking Ball” abriu uma fundação para ajudar jovens LGBT moradores de rua, ajudou a criar mais conscientização sobre transgeneridade e participou de uma campanha para ampliar as vozes de pessoas transgênero.

Entretanto, seria positivo, também, que Miley usasse a mesma dedicação para se educar sobre racismo.

Azealia Banks:

Embora Azealia Banks não seja uma figura muito popular, é inegável sua contribuição sobre a discussão do racismo e no debate da apropriação cultural, tendo chamado a atenção da rapper Iggy Azalea diversas vezes sobre o tema. “Sinto que, nesse país, quando se trata de nossas coisas, como problemas dos negros, ou políticas para negros ou música negra, ou algo do tipo, sempre há uma corrente do tipo: ‘Dane-se’. Sempre há um ‘danem-se todos vocês’; ‘Vocês não possuem nada’; ‘Vocês não têm nada'”.

Ariana Grande:

Enquanto esperamos um single sucessor de “Focus”, vemos Ariana Grande bater de frente com machistas e homofóbicos. A cantora não tem paciência para preconceito e rebate quando se depara com algum tipo de discriminação, como quando esteve numa rádio para promover sua música.

Questionada por um dos locutores sobre o que faria pela última vez, passar maquiagem ou usar seu telefone, caso o mundo acabasse, ela respondeu: “É isso o que você acha que meninas têm problema para escolher? É isso o que os homens assumem que nós, meninas, teríamos que escolher?”

No ano passado, Ariana Grande também escreveu um manifesto feminista, afirmando que não quer mais ser classificada como a ex-namorada de alguém. “Eu não pertenço a ninguém, a não ser a mim mesma.”

Demi Lovato:

Demi Lovato tem usado seus meios para acabar com o estigma sobre doenças mentais, algo que ela conhece bem, pois teve de lidar com elas até ser internada numa clínica de reabilitação. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 7% da população mundial, ou cerca de 400 milhões de pessoas tem depressão, por exemplo. Um número muito grande para uma doença pouco conversada e tratada como algo passageiro.

A voz de “Confident” sabe da importância das palavras e é porta-voz de uma campanha que encoraja jovens com algum tipo de doença mental a procurar ajuda. Não só isso, ela foi ao Congresso americano pedir por uma reforma no tratamento de doenças mentais. “Quatro em cada dez pessoas conseguem o tratamento que precisam, o que te leva a pensar quantas outras pessoas não estão conseguindo o mesmo, o que tem levado a muitos problemas”, disse certa vez.

Por fim, Demi ainda tem encorajado meninas a aprenderem a amar seus corpos e não terem mais vergonha deles. Foi por isso que ela aceitou fazer um ensaio nu para a Vanity Fair. “É empoderador e mostra a outras mulheres que você pode superar obstáculos envolvendo a forma como você vê seu corpo, e você pode sentir-se confortável e confiante em sua própria pele”.

Karol Conka:

Karol Conka é uma das divas da nossa música e não fica quieta quando o assunto é racismo. “Tudo que o opressor quer é que o oprimido se cale. Quando isso não acontece, eles falam que é vitimismo. Eu falo mesmo, sei que tô certa. Passei minha vida inteira sendo xingada, o Brasil tá careca de saber quais são as piadas, chega”, contou a artista ao PapelPop.

No ano passado, quando um dos integrantes do grupo Fly comentou para uma revista que tranças “são uma salvação para quem tem cabelo ruim”, Karol Conka fez questão de rebater. “Primeiro, quando eu li, fiquei assustada, depois triste de ver que uma geração de adolescentes que compram a revista, assim como eu fiz há anos, se espelham no que tá sendo divulgado”, disse a cantora. “E esse assunto não terá fim enquanto houver gente equivocada achando que não vai dar em nada. O Brasil precisa aprender a respeitar as diferenças. Meu conselho é que tenham cuidado quando forem falar da gente, mulheres, gays, negros e pobres. Acredito que somos maioria nesse país, e uma maioria que compra revistas e CDs.”

Janelle Monáe:

No que diz respeito ao racismo e violência policial, Janelle Monáe faz mais do que apenas cantar. Além de lançar uma nova versão de “Hell You Talmbout?” com nomes de pessoas negras mortas pela polícia, ela também liderou um protesto na Filadélfia, capital da Pensilvânia, contra a truculência policial. Segundo reportagem do site Refinery29, desde a morte de Michael Brown pela polícia, entre agosto de 2014 e agosto de 2015, mais 314 negros perderam suas vidas da mesma maneira.

Ludmilla:

Ludmilla foi a mais nova celebridade vítima de racismo. Enquanto ela brilhava na sua estreia na Sapucaí, a socialite Val Marchiori, comentarista do Carnaval da RedeTV!, disse: “a roupa está bonita, a maquiagem também. Mas esse cabelo está parecendo um bombril”.

A mãe de Ludmilla foi a primeira a falar. “Aquele não era o cabelo da Ludmilla. Ela estava usando uma peruca, assim como outros integrantes da escola. Agora, independente disso, e se fosse o cabelo dela? É lamentável. Infelizmente, o preconceito existe e ele está aí. A gente vive com ele diariamente”.

Em seguida, foi a vez da própria artista se pronunciar, respondendo com classe ao comentário de Val Marchiori. “Tenho muito orgulho da minha raça e não vai ser qualquer pessoa que vai me colocar pra baixo por puro preconceito, SER CHIQUE É TER VALOR E NÃO PREÇO!”

*Por Artur Francischi, do Prosa Livre


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