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Elza Soares, A Mulher do Fim do Mundo, comemora mais um ano de uma vida de luta


Em entrevista à Midiorama, Elza falou sobre sua vida, sua obra e o álbum A Mulher do Fim do Mundo

“A Mulher do Fim do Mundo” não é apenas o nome do último álbum de Elza Soares, mas também uma descrição da força desta que é uma das maiores vozes do Brasil. Com uma história de superação, Elza nasceu na favela Moça Bonita, em Padre Miguel, no Rio de Janeiro, casou aos 12 anos de idade, por imposição do pai, e foi mãe, pela primeira vez, aos 13. Aos 21 anos, já com cinco filhos, ficou viúva. Mais tarde, casou-se com o jogador de futebol Garrincha, com quem viveu por 16 anos, teve mais um filho e afirma ter sido um grande amor.

Entre muitas críticas e sonhos, Elza nunca desistiu de lutar – queria uma casa com banheiro, já que não tinha onde cresceu. Quando realizou este sonho (entre outros) e ganhou voz, passou a fazer de suas músicas, manifestos, e lutar pelo direito das mulheres e contra o racismo:

“E ainda não criamos uma medicina para curar essa doença maldita, que é o tal do preconceito”, disse em entrevista à Midiorama.

No dia 18 de março, se apresentou no Circo Voador em um dia histórico, em um show inesquecível com a presença de Caetano Veloso. Em uma conjuntura nacional de sensibilidade política, os dois cantaram para um público predominantemente jovem, ávido pelas mensagens que cada música passava:

Em entrevista por telefone para a Midiorama (feita por Artur Francischi, do Prosa Livre, e Horácio Brandão, do Midiorama), Elza, que foi considerada pela BBC “a melhor cantora do milênio” falou sobre o premiado álbum A Mulher do Fim do Mundo, sua vida e sua obra. Confira:

Você é conhecida não só pelo seu talento, mas por sua força e determinação. De onde a Elza tira tanta força?

A necessidade me obriga. O tempo que você vai ficar chorando, tem que ir à luta. Você não tem que chorar, tem que buscar. Não tem que retroceder, tem que caminhar, tem que ir em frente. E é o que eu faço. A necessidade me obriga.

Você veio de uma realidade muito difícil e que ainda é, infelizmente, muito comum para milhares de brasileiros, em especial, homens e mulheres negros. Mas a senhora conseguiu reverter o quadro. Há algum conselho que você daria a essas pessoas?

Uma andorinha só não faz verão. Havia necessidade, sim. [E] uma pessoa sozinha pode falar, ela pode sentir tudo, ela pode se dedicar, mas falta força. Falta gente unida para fazer a coisa mais forte.

Eu queria que a gente falasse do passado: quando você era menina, e um dia despertou para sua voz, você imaginava que iria fazer esse caminho que você percorreu até hoje?

Mas nem nunca. Nunca pensei por uma razão: porque cantar na minha época era ser puta. Mulher era ser puta. Minha mãe dizia “Deus me livre, não quero puta na família”, eu falei: “então, já tem uma. Não vou deixar de cantar porque eu gosto, porque eu amo.” Eu fui embora, eu fui em frente, porque tudo o que eu queria fazer era cantar.

Se tivesse a oportunidade de escolher, voltaria na pele e numa vida parecida com a que viveu a Elza Soares ou escolheria uma outra?

Se eu viesse com a sabedoria, eu gostaria de ser a Elza, porque outra eu não sei como seria. Pode ser uma covarde. Pode ser uma fraca. Eu prefiro a Elza forte.

O álbum A Mulher do Fim do Mundo começa com a música homônima e você canta “até o fim eu vou cantar, eu sou mulher do fim do mundo. Me deixem cantar até o fim”. Esse é também um desejo da Elza? Continuar cantando para sempre?

Até o fim. Até quando eu puder, eu vou cantar. Quando eu começar a desafinar, eu paro, mas ainda não. Eu tô cantando bem à beça, graças a Deus. Eu quero cantar até o fim, porque eu acho que a música, eu sempre digo que a música é o sedativo da alma, que é a medicina da dor. A música é tudo.

Suas músicas têm um teor político forte. A Nina Simone, grande cantora americana negra, disse que escolhia refletir a época em que vivia em sua música. É uma escolha pessoal sua também?

Lógico. Não quero imitar ninguém. Eu faço isso porque sou negra mesmo. E como mulher negra, eu acho que eu tenho a obrigação de falar, de abrir a boca, de denunciar o que não tá bom. Não só para mim, mas para todas as mulheres.

E no que diz respeito às mulheres brasileiras: você acha que houve uma melhora na vida delas?

Houve uma perspectiva de melhora, porque hoje ela pode falar, pode gritar, pode denunciar. Mas ainda falta muita coisa pra mulher brasileira. Falta muita coisa. A mulher que trabalha igual ao homem não tem um salário igual ao do homem. Ela é mulher, ela é a mãe. Temos que olhar pra mulher com mais carinho, com mais respeito e mais dignidade.

Num show no Rio de Janeiro, durante a música “A Carne”, você fez uma menção ao assassinato daqueles cinco jovens negros pela polícia carioca. A carne do negro continua sendo mais barata? O que sentiu quando soube da notícia?

Eu chorei, chorei a tarde toda. Porque eu acho que é incrível ainda existir esse tipo de coisa, entendeu? E ainda não criamos uma medicina para curar essa doença maldita, que é o tal do preconceito. Precisa encontrar algum remédio pra livrar a gente desse mal.

A entrevista completa, você confere aqui.

Em mais um ano de vida de Elza Soares, que ainda possamos aprender muito com ela. E que ela cante até o fim.

Por Isadora Ancora

 


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