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Showbusiness pela visão de Fabiana Lian, fundadora da On Stage Lab


Tem vontade de conhecer a fundo como funciona o showbussiness? Então leia a entrevista na íntegra e conheça uma das maiores entendedoras do mercado de espetáculos do país.

O mercado do showbusiness sempre gera interesse e até mesmo curiosidade nos amantes da música e do entretenimento. O que será que acontece nos backstages? Como os artistas se comportam e com quem eles trabalham diretamente durante as turnês? Como funciona para trazer um grande show para o Brasil? Quais são as partes envolvidas nesse processo e qual a responsabilidade de cada uma delas no espetáculo final?

São tantas perguntas que achamos melhor entrevistar uma pessoa da área que já vivenciou todos os lados da moeda quando o assunto é shows: Fabiana Lian! 

De freela de tradução, assistente de produção à coordenadora de festivais. Hoje, Fabiana compartilha seu vasto conhecimento e coloca os profissionais da área para conversar. Junto com Bianca Freitas, criou o On Stage Lab, que surgiu da ideia de promover o mercado de shows e deixa-lo ainda mais profissionalizado para os futuros produtores. Com cursos extensivos que abordam diretamente os shows  e o mercado fonográfico, que inclui aulas teóricas e práticas que funcionam como uma imersão direta na área.

A On Stage Lab também tem cursos específicos voltados para as mais diferentes áreas do showbusiness: tour management, direção de palco, backstage, contratação de artistas, comunicação para a música, e mais. Tudo para que nossos alunos tenham a formação mais completa possível em suas áreas favoritas do negócio.

Este ano a On Stage Lab traz o Warped Tour Experience – Um fim de semana com os organizadores do festival mais dinâmico do mundo. Legal, né?! Para entender mais, assista o vídeo e depois leia a entrevista na íntegra. Afinal, não é todo dia que um profissional desta área tão cobiçada abre o coração e conta suas histórias mais improváveis.


Onde e quando você acha que iniciou a jornada que a trouxe até aqui?

Foi quase por engano. Eu tinha um outro trabalho, filha pra criar, vivia dura e comecei a dividir o apartamento em São Paulo com um grande amigo que na época trabalhava com shows internacionais pela Water Brothers. Ele estava montando equipe para o Monsters of Rock e me chamou para ser interprete de banda. Logo pensei: “Ai, meu inglês não dá pra isso não”, e fiquei ali de estagiária do assistente, do assistente, do assistente da sala de produção gringa.

No fim, meu inglês dava sim! Logo apareceu outro trabalho, daí de intérprete de banda, depois outro. Quando eu vi, estava só fazendo isso na vida. De turnê em turnê, virei Tour Manager.

Ainda olhando lá pra trás: você lembra o que imaginava ser o trabalho nos bastidores do showbiz? E olhando de trás pra frente: poderia prever o caminho que trilhou?

Quando eu via esses meus amigos que trabalhavam na área, achava que a vida deles era de hotéis, aviões, drinks com artista, vida de ricos e famosos. Não vou mentir, tem um pouco disso… bem pouco! Mas não tem glamour nenhum em dormir pouco, passar apertos de produção em alguns casos, não lembrar direito em que cidade você está pois é uma por dia. É trabalho! E como disse Tom Jobim uma vez: “trabalhar dói”.

Eu não imaginava que algo que começou meio que pra ganhar um extra fosse virar meu ganha pão, e eu acabasse sendo conhecida no meio e fazendo parte de todos os projetos que fiz.

Havia uma bula, manual , bússola para direcionar o seu trabalho?

Hahaha! Só se fosse uma bula com as instruções: Cuidado pra não quebrar o artista!

Brincadeira! Não. Nada de bula ou sequer um manual. Maaaas, fui prestando atenção nos processos, nas regras implícitas de etiqueta no backstage, o funcionamento das relações. Mas isso tudo era muito intuitivo no fim das contas e só fui entender quando precisei formalizar para a minha primeira palestra e contar o que e como eu fazia.

Quais foram seus “mestres” e grandes influências durante esse processo?

O Fê (Fernando Henriques) meu amigo, que me levou para o primeiro job, foi um guia muito bacana de comportamento. Pensando bem, ele traduziu algumas das regras implícitas pra mim. Fê, você foi alçado a “Bula” agora mesmo!

Teve a Monica Margato, que era gerente de produção da Mercury e, depois, CIE e T4F. Ela foi muito importante pra mim porque era crica e detalhista como chefe. Fizemos dezenas de turnês juntas e éramos super cúmplices e parceiras. Eram muitas risadas no meio da mentoria!

O Phil Rodriguez da Evenpro (Hoje, Move concerts) foi quem me levou para as turnês na América Latina. Ele tem uma personalidade generosa e é um gentleman. Eu aprendi muito sobre negócios, modus operandis de promotor de show. Fiz Iron Maiden, Red Hot Chilli Peppers, Justin Bieber, Elton John na A.L. com ele.

E os artistas! As bandas são grandes mestres também. Você aprende o funcionamento em comum que Madonna e Cat Power tem, e as diferenças também, um Mc Fly nunca terá o mesmo funcionamento do Tony Bennett.

Explica um pouco quais foram as etapas do ” jogo”: que funções exerceu gradativamente? Conte como foi degrau a degrau.

Primordialmente eu era uma intérprete de turnê. Esta função é de assistente de produção. Uns chamam de babá de artista (tenho raivinha desse nome) porque colam no artista e em seu Tour Manager e é a porta da relação durante a estada deles por aqui. Isso acabou trazendo uma segunda função que só aconteceu porque eu era destemida. Como eu já estava com o artista, fui colocada pra traduzir a coletiva do Bruce Dickinson bem nos moldes, não sabia que era difícil, fui lá e fiz. Isso gerou alguns trabalhos para gravadoras.

Coletiva é uma fogueira desgraçada, mas eu adoro fazer. Há momentos de saia justa, o artista querendo pular no cangote do repórter insidioso.

Depois comecei a me envolver mais nas etapas anteriores a chegada do artista, e cuidar do pacote que eu recebia pronto: vôos, hotéis, tour book… e virei Tour Manager e coordenadora artística de festivais. Depois fiz booking e promovi shows internacionais, além de curadoria e produção cultural. E hoje cuido da On Stage Lab.

Se um E.T. te sequestrasse e estudasse suas aptidões e feitos, o que ele encontraria no case?

Uau!! Essa é difícil! Ele ia desistir de desvendar logo e ia me devolver!

Acho que a maior aptidão talvez seja flexibilidade. Você tem que ter capacidade de exercer várias coisas, ou estar aberta a fazer coisas diferentes. Tem uma certa coragem, que na verdade eu confundo um pouco com ser meio retardada na hora de se apavorar. Quando tive que sair no palco e contar pra plateia do Iron Maiden que o show ia ser cancelado, nem pensei nos tomates e vaias na hora.  Só foi cair a ficha de tudo no dia seguinte…

Acho que encontraria uma trajetória de quem se diverte bastante. Isso não quer dizer que não tenha encarado trabalhos e momentos muito chatos. Mas eu acho que fiz mudanças importantes quando a chatice ficou maior do que os momentos de realização. Eu gosto de desafio, de resolver problemas.

Quais foram os highlights dessa jornada, os principais eventos e personagens?

Ai, eu sou muito exibida por essa! Um dos meus primeiros trabalhos foi com David Bowie!!!! Foi difícil não pagar de fã porque ele era o homem da minha vida. Tinha foto, discos, era talvez minha maior referência. Aprendi no tapa sobre postura! Foi lindo.

Chrissie Hynde do Pretenders: essa é uma história muito improvável, o povo acha que é mentira. Eu estava coordenando um festival – o BMF com Pretenders, Simply Red, Alanis, etc. – e tinha contato superficial com os artistas, pois cada um tinha os intérpretes que eu tinha contratado. A Chrissie foi a uma rádio, lá no centro, e viu um prédio super bacana e ela tem mania de se apaixonar pelos lugares e querer comprar, alugar e se mudar. Na época eu estava grávida do 3º filho e queria me mudar para uma casa e alugar meu apartamento na Av. São Luis. Minha filha mais velha tinha 14 anos, tava sozinha em casa e (errado, mas foi certo!!) abriu a porta pra alguém que queria ver o apartamento. Lá estava a CH com seu interprete. Minha filha tinha ido ao show no CChal, no dia anterior, e ainda não tinha se recuperado da porrada que é um show do Pretenders e quase morreu do coração!!

Bom, a partir dali ela começou a me ligar até conseguir alugar meu apartamento por um ano. Nesse período, fizemos um projeto super bonito juntas – uma turnê solo com Moreno+2. Ficamos muito amigas. As duas vezes que estive em Londres nos vimos. Ela é uma figura! Ela foi me pagar no hotel no seu Mini, junto com um pitbull que ela tinha adotado. E, claro que o bicho teve que vir no meu colo. Fui dura o caminho todo até a casa dela!

Esse momento: Iron Maiden no HSBC Arena, no Rio, é um highlight da minha “retardadice” que comentei ali em cima. A barricada rompeu, o Bruce Dckinson segurou a plateia um pouco e saiu do palco. Em 15 minutos, durante uma conversa com o manager, o promotor e a casa nos bastidores, decidimos que o show seria adiado para o dia seguinte. E fomos, eu e o Bruce Dickinson, lá na frente contar isso para os 15.000 metaleiros mega fãs. Ele falava e o povo aplaudia, eu traduzia e era super xingada.

No dia seguinte, tava destruída, sem nenhuma energia. Tive que tomar banho de sal grosso e ligar pra minha mãe e dizer pra ela que ela não era nada daquilo do que chamaram na noite anterior!

 Quais os do’s e os dont’s de quem quer ser uma Fabiana Lian?

Do: Fique atento a oportunidades. Crie empatia com o Tour Manager da banda – mais do que o artista -, ele é o cara que sabe das prioridades e manhas daquela produção. Certifique-se sempre mais de uma vez. Antecipe-se aos problemas. Entenda as prioridades. Entenda que as prioridades podem mudar no minuto seguinte. Conte sempre a verdade. Arrume um jeito light de contar uma notícia ruim. Trabalhar junto sobre o problema é mais legal. Seja discreto – what happens backstage, stays in backstage. Keep Calm and Keep Calm.

Don’t: Não tenha medo de ser chato ao se certificar das coisas. Não deixe o fã ser maior do que o profissional. Não leve eventuais gritos ou asperezas para o pessoal. Não ache que você virou gringo porque a banda adora você e reclama do promotor (que te contratou). Não guarde informação: faça ela fluir no grupo.

E o curso: qual foi seu imput para criá-lo? Conte um pouco dessa história

De novo… caiu no meu colo. Em 2008 uma escola de áudio de São Paulo, a OMID me chamou pra uma palestra sobre shows internacionais. Eu comecei a preparar o que falaria e levei um susto. Não é que eu tinha o que falar?! E não eram só as histórias divertidas. Tínhamos aprendido e construído um jeito de trabalhar com isso no Brasil. E sim, havia regras, processos, jargões, padrões. Foi uma epifania!! Rsrsrs

Depois montei um curso independente, no hotel Hilton em SP. Coordenei um curso na OMID. Em 2013, a Bianca Freitas, que era sempre palestrante convidada nos meus cursos, nos levou pra Escola São Paulo. Ali nasceu o curso Showbusiness, no formato que temos hoje.

Em 2014, viramos independentes e oficializamos a On Stage Lab. Hoje temos nosso espaço de aulas e mais vários cursos, intensivos e extensivos. Vamos trazer um workshop sobre o Festival Warped Tour. Esse vai ser lindo! Os caras tem um modelo só deles. Montam e desmontam o circo de festival em 43 cidades.

E, promovemos talks e palestras. Queremos colocar o povo do entretenimento e da música pra conversar, achar soluções juntos. Precisamos ser mais frente! Acho que quem está chegando tem um atalho que a gente construiu: as aulas, o networking. Mas quem está atuando pode se reinventar para acompanhar e promover as mudanças. E tenho sentido uma ressonância muito legal nisso tudo. O mercado precisa se comunicar. E, os profissionais, uma vez que vencem a barreira de se colocar – seja para um colega numa mesa de discussão, ou para um grupo de alunos, – tem uma epifania igual a que eu tive. rs. É muito enriquecedor você sair da sua zona de conforto e se observar ao se mostrar.

Como tem sido o resultado prático para os alunos? Muitos já se inseriram no mercado?

Acho que é sempre muito rico para eles, pois a gente traz pra sala de aula profissionais que estão atuando. Temos o VP da Heineken, empresária do New Order, Tobal do EDA, Alex Wesey da T4f, o Fabiano da Move, e muitos outros. Isso traz uma oportunidade de networking por si só. Além disso, temos as atividades práticas e os alunos tem possibilidade de exercer ou acompanhar algumas funções. Isso acaba dando a oportunidades de mostrarem seu perfil.

Sim, temos alunos colocados como freela ou fixo na T4F, na Move, na Mercury, na Let’s Produções, na SFX e muitos outros!! É bem legal você ir negociar ou encontrar esses alunos trilhando suas trajetórias! Confesso que ainda não parei de me comover.

Por Horácio Brandão – Midiorama


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